Terça-feira, 25 de Maio de 2021

Opinião

Declaração de guerra ao Serviço Nacional de Saúde

Jorge Pires 

No pas­sado dia 3 de Maio, apro­vei­tando o facto da União Eu­ro­peia re­a­lizar a dita Ci­meira So­cial, em que par­ti­ci­param vá­rios chefes de Es­tado e de go­verno, mais de duas de­zenas de es­tru­turas que re­pre­sentam o sector pri­vado da saúde em Por­tugal, jun­taram-se no Porto para apro­varem uma de­cla­ração Sis­temas de Saúde Fo­cados nas Pes­soas e nos Re­sul­tados, cujo con­teúdo, por mais dis­si­mu­lado que es­teja, não con­segue es­conder os ver­da­deiros ob­jec­tivos: es­tamos pe­rante uma ver­da­deira de­cla­ração de guerra ao Ser­viço Na­ci­onal de Saúde.

Face à ofen­siva, o Es­tado deve re­forçar o SNS em meios hu­manos e ma­te­riais

 

 

Esta ini­ci­a­tiva, cujas pro­postas são di­ri­gidas à Co­missão e Par­la­mento eu­ro­peus, mas a pensar so­bre­tudo em Por­tugal, onde jun­taram pela pri­meira vez em muitos anos todas as es­tru­turas re­pre­sen­ta­tivas do sector pri­vado, que têm em comum a de­fesa do ne­gócio da do­ença, é o cul­minar de um ano mar­cado por uma ofen­siva sem pre­ce­dentes contra o SNS, em que pro­cu­raram, apro­vei­tando al­gumas in­su­fi­ci­ên­cias do ser­viço pú­blico na res­posta aos do­entes com ou­tras pa­to­lo­gias que não a COVID-19, apa­recer como os sal­va­dores da pá­tria, in­sis­tindo na tese de que a so­lução de fu­turo passa so­bre­tudo pela ini­ci­a­tiva pri­vada.

Ao longo dos anos, par­ti­cu­lar­mente neste úl­timo, este con­glo­me­rado de in­te­resses ins­ta­lados na saúde pro­curou im­pedir a ar­ti­cu­lação e ex­plo­ração das in­te­grais po­ten­ci­a­li­dades do SNS, si­ti­ando-o e uti­li­zando-o como ins­tru­mento da trans­fe­rência de re­cursos pú­blicos para a acu­mu­lação pri­vada.

Não es­tamos pe­rante mais uma ini­ci­a­tiva in­te­grada na cam­panha contra o SNS. Este é um passo muito sig­ni­fi­ca­tivo na ofen­siva cujo ob­jec­tivo é, desde há muito, a cri­ação de um «sis­tema na­ci­onal de saúde» como uma pre­tensa so­lução de fu­turo. Dizem os pro­mo­tores da ini­ci­a­tiva que são por­ta­dores de uma so­lução efi­ci­ente e sus­ten­tável, con­si­de­rando o sector da saúde um im­por­tante con­tri­buto para tran­sição cli­má­tica e trans­for­mação di­gital, onde todas as suas com­po­nentes – pri­vado, so­cial e pú­blico – co­mu­ni­quem entre si, cri­ando desta forma as con­di­ções para que os do­entes cir­culem no sis­tema.

Uma cir­cu­lação que se faz num sen­tido, o dos pri­vados, fi­nan­ci­ados com di­nheiros pú­blicos e com uma pres­tação de cui­dados cen­trada nos se­guros de saúde, dei­xando como al­ter­na­tiva aos dois mi­lhões de po­bres um ser­viço pú­blico mi­ni­ma­lista, des­va­lo­ri­zado, com ga­rantia de ser­viços mí­nimos.

Es­tamos pe­rante uma pro­posta de es­tra­tégia que se in­sere numa ló­gica de des­natar o sector pú­blico com re­cursos fi­nan­ceiros pú­blicos por via da dis­so­ci­ação do pro­cesso fi­nan­ci­ador/​pres­tador e de apro­fun­da­mento das de­si­gual­dades no quadro do sis­tema a duas ve­lo­ci­dades que de­corre da opção uti­li­zador/​pa­gador.

Ao longo do texto uti­lizam ex­pres­sões como «uma ar­ti­cu­lação in­te­li­gente e trans­pa­rente entre sec­tores» e «as­sumir as pes­soas no centro do sis­tema», com que pro­curam es­conder a ló­gica de fun­ci­o­na­mento dos grupos pri­vados: o ne­gócio da do­ença.

Pro­cu­rando po­si­ci­onar-se onde está o di­nheiro fácil, apontam, como ele­mento cen­tral para as es­co­lhas dos países da UE, o facto dos «agentes pri­vados terem uma ex­pressão sig­ni­fi­ca­tiva não só no sector da saúde como na eco­nomia eu­ro­peia». Sempre a saúde mis­tu­rada com o ne­gócio.

Se dú­vidas pu­dessem existir sobre o que os por­tu­gueses podem es­perar das ori­en­ta­ções de­fen­didas na de­cla­ração do Porto, basta fi­xarmo-nos no que acon­teceu no úl­timo ano, quando o País foi con­fron­tado com o agra­va­mento da si­tu­ação epi­dé­mica, si­tu­ação em que os grupos pri­vados, ou se es­con­deram ou fe­charam uni­dades, dis­po­ni­bi­li­zando al­gumas camas, não para o com­bate à COVID-19, mas para a re­cu­pe­ração de ci­rur­gias - o que dá lucro.

Ao longo das nove pá­ginas do texto não fazem uma única re­fe­rência ao Ser­viço Na­ci­onal de Saúde, ig­no­rando por com­pleto a exis­tência de um pre­ceito cons­ti­tu­ci­onal que atribui ao SNS o papel prin­cipal na ga­rantia do acesso à saúde, bem como à exis­tência de uma nova Lei de Bases da Saúde que aponta no mesmo sen­tido.

Pe­rante mais este passo na ofen­siva contra o SNS, cabe ao Es­tado res­ponder da única ma­neira pos­sível – re­forçar o Ser­viço Pú­blico de Saúde, do­tando-o das con­di­ções ne­ces­sá­rias para as­sumir as res­pon­sa­bi­li­dades cons­ti­tu­ci­o­nais que lhe estão atri­buídas, no sen­tido de ga­rantir o acesso dos por­tu­gueses aos cui­dados de saúde, in­de­pen­den­te­mente das suas con­di­ções so­ciais e eco­nó­micas.

publicado por usmt às 18:52
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